Livro 4 de Poesia
Escrever é uma tarefa mental, disse certa
vez, o poeta Dylan Thomas. Em verdade, quando estamos à mercê de uma nova ideia,
trabalhamos com a imponderabilidade da inspiração. Os elementos formais,
emissores naturais, fundamentais ao processo de criação são o nosso estilo e as
nossas retóricas. Podemos afirmar que são alimento, o pão e o leite, que sustenta
a energia emanada do cérebro e da alma de um escritor.
Da alma e do cérebro emanam as expressões
concretas e as epifanias: impulsos poéticos, inspiração súbita, que vão
sedimentar e ratificar a perícia e o senso estrutural de um artesão. O poeta não
procura o lugar comum ou a rima fácil, pois que vive ávido por redimir
contrários, criar imagens reticentes e multiplicar o conteúdo de cada palavra.
Não existe teoria, quando acreditamos nos impulsos benéficos e na emoção
momentânea. Poeta ou escritor, eu, particularmente, busco nos
artesões dogmáticos as minhas afeições pessoais, pois que entendo a Literatura como
uma arte que trabalha com a substância da palavra, que difunde o indivíduo,
ilumina um lugar isolado no tempo, busca um rosto sombrio na massa ... É nela
(literatura) onde encontro as ferramentas que levam-me a trabalhar pela palavra
e não para as palavras.
Literatura não pode ser aquela coisa dura,
academicista, sem alma. Literatura é arte e jamais poderá ser teorizada como um
simples estigma gráfico. Como escritor e poeta, eu ainda busca o meu lugar no
mundo, por isso não vejo a poesia como algo que se assemelha ao gozo numa
cópula: poesia é o refinamento das concepções, apesar de utilizar o nosso corpo
como moinho; e ainda há os emissores, que são os diversos espíritos que em nós coabitam
durante o processo. Tudo isso me leva a crer que, se a poesia incorpora em mim
como deleite, ela é mais espiritual do que corporal.
TEMPO PERDIDO
Chegou em certa manhã uma carta comunicando o fim
da inocência | Os meus olhos transbordaram de gratidão | O rosto ficou iluminado
pela luz divina. Felicidade profusa ... Enfim, conscientizei-me de que havia
algo profundo dividindo vastos mundos | E um semblante mesclando tonalidades confusas.
Eu que antes olhava em tudo com tédio e indiferença
| Não percebi crescer atrás do seu doce olhar uma pungência suave, uma
pungência felina ... Eu, que buscava sempre a ti, perdi a certeza das coisas. O
senso ímpio já atuava onde tudo era maquiagem. Eu tolo não percebi. Devotei-me então a contar fábulas. Resolvi construir
um íntimo deserto e É para onde vou, quando quero chorar. Fui aquela árvore que recebeu machadadas vigorosas,
mas não ficou impassível. Algo dentro de mim ainda chora em silêncio. Quando
dei-me por vencido, sem forças para lutar, tombei com o gemido grave dos
jequitibás. O tempo seria aquele e passou ... Nunca mais o
teremos como imaginamos.
A tua ausência, bem como o teu cheiro, revigoram as
minhas flores, alimentam o meu dia-a-dia ... O silêncio entumeceu as palavras. As
coisas que não foram ditas transformaram-se em outra coisa, em algo indizível,
inexorável. As penas já se soltaram dos pássaros ... Eles agora já se aproximam
das nuvens e os seus reflexos estão contabilizados pelas Galáxias.
Acordei de um sonho já esquecido, olhando estrelas
e nuvens ... Flutuava perto da lua, quando alguma coisa chegou até mim. Era a parte
final de um sonho triste. A beleza passou, como passaram todas as coisas no
tempo perdido. Estou escrevendo novas árias. As palavras desnecessárias não
preencherão mais o meu silêncio.
Deus, fim de todas
as canções
Senhor, eu não sei se Vossa Santidade desce ao clamor dos livros dos homens
tristes. | Não sei se reconheces uma única linha, em meio a tecelões e novelos.
Permita ao meu coração, um minuto santo. Meu Santo! ... Antes de condenar-me, Abra
o teu coração com o meu bom conselho!
Senhor Deus, livre-me do riso bêbedo dos burocratas | Eu sei que os meus
quereres não têm domínio | Com paciência, eu tudo suporto, porém a minha
esperança é cega e iconoclasta. | Esta palavra exerce sobre mim um grande
fascínio ...
O meu filho saiu à rua e foi completamente esmagado | Suas personagens eram
ainda tão jovens e cheias de amor e de escrúpulos! | Seus homens de aço foram mortos
nas oficinas | Diálogos, temas, narrativas incinerados pelo exército das vaidades...
| Um rolo compressor de déspotas absolutos!
Meu Santo Deus | Deixa-me tocar pessoalmente a sua ternura?! | A minha alma
precisa livrar-se das minhas mágoas | Sois Deus, e eu o reconheço, pois que
desfilas pela minha rua | És brilhante | pois vejo-o banhar-se na foz em que o
poluído East deságua.
Confesso | Fui andarilho nas noites frias de Compostela | Caminhei pelas
galáxias do homem feito santo | Santiago | Eu pretendia acompanhar o profeta
louco | identificar cada estrela, | guardar os moinhos, | dormir pelos
caminhos como faziam os déspotas, como fazia Goya e os seus deuses redivivos, enlutados.
Pombal, marquês, gajo bandido! | Nunca será tarde para o ter ofendido | Por
que roubastes 100 anos de nossas crianças? | O poeta sustenta sua voz | Ao vê resgatado o último soldado | retraído, ele
se levanta e acorda o sol. | A sua poesia já alimentou as esperanças
que viviam iludidas com um indefectível bico de cola.
Senhor, conceda-me a palavra que arranque a maquiagem das mulheres gordas| Conceda-me
a palavra gorda que traga a aceitação ao controverso | Um burguês entediado não
esquece os seus conflitos | Tampouco se aplica à amargura de um livro complexo |.
Arranque-lhe a armadura, Meu Santo Deus! Deixe-o sangrando à míngua | Seja
perverso! | Ensina-me a mágica que faça o homem de ferro sorrir para um verso
simples | Quero ver sua língua afiada deslizar pela lâmina suave do meu verso. Esta é a peça alucinógena, Meu Santo Deus. Vaidade ou capricho ... Peço
desculpa, Meu Senhor, e me despeço.
BODOQUE
Não somos mais tão jovens | Somos liberais esclarecidos | Não misturamos fatos e focos na mesma fruteira | Jamais seremos um quadro sinótico | A vida em comum talvez só nos acompanhe |Enquanto durar o conteúdo erótico. Até lá, compartilharemos o cigarro, a bíblia, bebida, a casa
e as boas maneiras | .
O mundo flui à nossa volta |. A minha paciência é sanfona | A minha coerência é boiada | E a vida que vai ser passada no moinho, já se desmorona | Se formos pensar o Mundo | O mundo está caótico | A fauna desordenada. |
As pessoas se matam diariamente |. Elas correm para fazer jus aos seus soldos | Assustadas, parecem se lembrar da vida tardiamente | A vida guardada nas cápsulas de compromissos! |
Quem não estiver do nosso lado, certamente estará em desacordo.
Quem se mantiver intacto, se perpetuará omisso |. Há aqui o desmoronar-se | Declama o decrépito faquir gordo |
O que vem a ser isso? ... Manobramos intenções e não optamos pelo simples. É ridículo, mas quero rir | Sou levado pelo rio das ironias |
Rio, Quixeramobim, Woodstock | ... O espelho haverá de quebrar-se e o fantasma estará rindo | A face à mercê do próprio bodoque.
ASAS E FOLHAS
Voo no vão do silêncio enluarado | bicando os grãos e as gramíneas que me
prezam |
Asas são feitas para dar vazão aos nossos sonhos | ...
Nas ruas de sonhos
dos meus sonhos, a beleza das flores é a canção que me enleva.
Beijo a carne dos teus lábios ressentidos | e neles descubro o néctar que
alimenta o meu desejo |
Quanto açúcar vivia em mim tão reprimido?! |
E quantas
bromélias ressaltam do teu rosto, em cada beijo?! ...
Prudence*
Querida, Prudence | hoje eu saí
com o Lennon a brincar |. Por que não fizeste
o mesmo? |
Recebemos o novo dia, e quando o sol levantou, o céu já
estava azul
Foi tudo muito
lindo! |
Seria melhor se estivesses lá.
Querida Prudence | hoje eu saí
com o Paul a brincar ...
Abri os olhos e
havia prudência em todo lugar |
O céu estava ensolarado,
mesmo com o vento fraco |
Os pássaros
cantavam com prudência
A prudência deve
fazer parte de tudo.
Prudência! ... Por
que você não abre os seus olhos fundos?
Eu olho e não vejo
mais nada ao redor,
Eu rodo, rodo, rodo
... E nada vejo.
Querida Prudence, queira-me fazer
sorrir |
Sou essa pequena
criança que não vê nas nuvens, correntes de margaridas
Quero sorrir
novamente ...
Apenas faça-me rir
de tudo nessa vida.
Venha conosco brincar?!
Não sei se ainda posso brincar com prudência|
Recebo o novo dia ... O sol
levantou, o céu está azul
O dia está lindo
e você não está?!
Por que precisamos de prudência
para brincar?
*Inspirado na canção de Lennon&MacCartney
O PAINEL DEPOIS DO GOZO
O homem entrega-se ao sexo nas páginas do seu livro | A música dos Stones reverbera
pela sala | Uma conhecida canção entranha pela carne e páginas do poema, demarcando
espaço, amplificando tempo e compasso, nas idas e vindas da sua ereção.
A companheira está inclinada sobre a juventude | A vergonha escorre pelos
seus lindos cabelos | A dúvida se contrai, escondendo seios, entre braços e
joelhos | Ninguém socorre a inibição com um bom conselho| Lágrimas e suores sequer
foram tocados |
Em frente ao painel imenso, na esquina, após o gozo | Há um confronto entre
o prazer e o cruel orgasmo | Tudo está tenso e vulnerável | O amor desceu ao
plano menor ... Por questões de princípio, todas as concepções políticas,
instintivas, Estão disciplinadas.
O passado sugere virtude | Mas está submetido ao próprio vicio | Maternidade,
angústia e vazio ... A menina retorna aos braços do homem | Retornam os Stones.
A música reverbera em meio à agridoce fumaça | Autômato, o casal revela as
vulnerabilidades pertinentes ao sexo fora da faixa.
PICASSOS FALSOS
Quando o ontem esteve aqui, você não estava
O hoje chegou pontualmente
e você não apareceu
Quando vier o amanhã, venha lhe dar um abraço
Ele lhe
trará esperança e coragem para enfrentar o que saiu do controle
Sua vida
estará no cinema
E a sua melhor parte adormeceu.
Tudo o que disseste no princípio, e não foi ouvido, um dia retorna |
E tu, por
que ainda não dissestes ao mundo quem és?! ...
O tempo passa e passará
vibrando, como um rio veloz |
Estaremos sem documento e sem Escola |
seremos amêndoas fora
da noz |
Um dia nos ultrapassou o verso reprimido,
O sexo com comprimido,
O Aedes aegypti e o vírus do Ebola! |
Como os seixos do rio que deslizam debaixo dos teus pés |
O seu próprio
discurso, hoje, o desconheceria.
As palavras ditas no passado, já o ignoram |
As
coisas que agora são ditas, se não tiverem originalidade, aceite. |
Palavras
mudam de lugar ou sofrem avarias! |
Elas se renovam com personalidade
Racionalizando a pressa,
As palavras sabem
encontrar sua hora.
Por isso, colha apenas o que é seu. |
O que vem por amor é primavera |
O
que não permanece conosco não pode ser castigo,
São filhos que damos ao mundo |
e por escolha do destino, eles vivem em paralelos contíguos |
São larvas que
buscaram solos mais fecundos.
PAINEL ESPELHADO
Um dia a beleza passa ...
Um dia ela resolve não fazer mais
parte da nossa vida |
Os lábios vermelhos, salientes, passarão a finos, desolados
|
O que ontem fora belo e instigante hoje está amparado na
talidomida.
Pensando no ocaso, foque no orgulho |
No futuro será a nossa mala-de-mão
|
A sabedoria será o estojo de maquiagem | ,,,
Abaixo dela estará uma vida mesclada na
impaciência e na ausência de carinho
Os sonhos passam ou se renovam |
A beleza, quando passa,
fecha caminhos |
A arte é se redimensionar dentro do tempo |
Recriando novas
embalagens ...
Nem tudo, afinal, nos será retirado |
Restarão os dons | que são
dádivas | e requerem muito carinho.
A inteligência é o poste iluminado de nossa rua |
Abra portas
e janelas para o futuro |
Solte a mão do passado! |
Ele estará sempre um passo
atrás de nós |
O território que ora pisamos é o presente ...
Reconheça-se no
painel espelhado |
Chegou a hora de identificar os que fizeram a opção por nós.
Se não forem reconhecidos é porque já fazem
mesmo parte do passado.
A REVOADA DOS PÁSSAROS BRANCOS
Quantos amores separam a juventude da velhice? |
Há um hiato, no meu peito,
clamando pelo amor que não disponho |
Os sóis vão se encolhendo no meu
horizonte sem prisma |
Os sais foram recolhidos
E não há luar ou céu bonito, dentro
dos sonhos que sonho.
Os rios estão secando no meu coração desértico |
O ouro desapareceu completamente,
no meu riso arenoso |
A contar pelas paixões, o meu coração não é tão velho |
É
um sino retinindo um som roucamente, doloroso.
A correnteza em mim é o aluvião que não draga |
Por isso, não quero desejos
impulsionados com miríades azuis |
Se a poesia só semeia em terra que o amor
consagra |
Não quero a poesia moldando os meus tristes e dogmáticos blues.
No meu coração endurecido há igrejas vazias e as intenções são vagas |
Não há batismos ou crismas no tempo perdido |
Palavras bonitas são como a chama
de uma vela ...
Quando pensamos que está acesa, até um vento maroto vem e a
apaga.
Se um dia o amor chegar até mim |
E eu me deparar com um beijo calando o
meu riso franco |
Liberdade ainda que tardia?!...
Eu temo que não haja mais a tão
sonhada revoada dos pássaros brancos.
Versos satânicos
Insultar a verdade e ofender a inocência causa estranheza. Eis a alegria amarga |
É como promover uma distorção dirigida entre crenças |
Desejar a justiça social é aguçar a conexão
violenta entre as bases |
Justas crenças que vivem obstinadas em assumir o que
não são capazes |
Justas bases que aspiram dirigir, mas vivem tensas.
Insultar a verdade é recriar a dependência |
Se
optares por viver uma vida devotada à inveja,
estarás perfeito no papel de
sujeição e violência |
Se pretendes recompensar as perdas que já não
são fugazes |
Por favor, libere a cerveja|
E passe a legitimar as visitas que
já são contumazes | ...
Ignorá-las seria sofisticar a imprudência.
Li no bloco de notas os versos do demônio visitante
– os tais versos satânicos!
Vamos combinar que não estavam ali a perfeição das
formas congeladas.
As melhores ideias eu as encontrei nos versos inacabados |
No
geral não vi sequer resquícios da beleza comentada.
Nunca acreditei na saga do ímpio arrependido |
E
o grande problema de uma ditadura
É o incauto esconder-se
atrás do poder de quem manda |
O grande dilema da democracia é a messe sonhar que um dia
fará parte da
demanda que mal foi consumida ...
A
fúria rígida não nos facilita.
Esta sempre
foi a maneira secreta (hoje aberta) de reagir do mundo.
QUEROMEACRE
Católico, Louco, Místico, Peregrino... Poeta, andarilho, sou Thoreau
Por que não posso ser Jack?
Amo, trabalho, sofro, sou um selvagem ... Sou caboclo rude, Latino,
Escravo emancipado Ignorando a liberdade
desse nova vida
Por que não posso ser black?
Não abandonei a postura latina de amante. Sou romântico, Sou cafona
Abuso muito das vogais. Escrevo os meus protestos ignorando as consoantes,
E se de repente eles decaem? ... Tornar-se-ão Ladinos, obsoletos, ineptos, dormidos,
atemporais ...
A vida é a chuva que me amedronta. A chuva é a vitrine que me traz bicos
Olhando a minha posição no tempo. Nada me consta!
No teatro do mundo, sou o escravo que ainda
vive ralando por papéis atípicos.
Nada fui ou serei neste inverno equinocial: cavaleiro intrépido, vivo
detido.
Tenho um filho que não me beija, devido aos meus bolsos varridos
Costuro a própria roupa, modelo os meus belos sapatos,
Mas não consigo escrever um reles destino
...?!
Ave, mãe
cheia-de-graça, acolhe-me.
Abraça-me! ... Antes
que a morte o faça!
O mundo abriu,
mesmo, mãos de mim.
A vida encolheu-me!
A vida desprezou-me!
Soltou-me entre os
joios ...
Se Deus me desse a graça de escrever alguns versos, eu os encheria de dor
E do caos dos desocupados.
O mundo é perverso!
Amar Trabalhar. Sofrer ... Eis o que sobrou para mim!
Neste circo está
todo o meu legado.
Andei por todas as ruas da América, solitário, perdido, entre tantos rostos felizes.
Percorri todas as estradas do mundo, cheguei a ver a luz noturna do arco-íris!
Eu quase a toquei! ...
Pela força da iluminação sagrada, como encanto,
Afora as almas. Afora os bodes. Afora os porres e
os grilos, ninguém sabe o que
passei.
Não fui aceito no mundo. Há descaso mais descabido?!
As minhas placas agora já se desmoronam.
O tempo cozeu suas cores, enfim tiraram-me da redoma.
Queromeacre! ...
Antes que a
voracidade dos glutões arrependidos aterrorizem a minha poesia com o massacre!
Antes que o cinismo e a ironias dos fracos me resguarde entre as madonas.
MULETAS
Carrego na cabeça as pedras e os tormentos do mundo
Aquilo que só a mim
pertence está no meu coração.
O que pretendo conhecer, encontro nos livros,
o
que ainda está por vir vive adormecido na razão ...
Se vamos ganhar, vai
depender da maneira com que buscamos.
Muletas não são ganhos que pedimos.
Levantem-se!
Elas poderão tornar companheiras inseparáveis.
Cuide de evitar maiores danos
A
negligência acolhe perdas irreparáveis.
O mundo e o desmundo operam mesmo é debaixo do pano!
T.S. ELIOT
A crueldade de maio fez a
terra morta germinar flores
e o
desejo simples agir como dono, arrancando o néctar pelas raízes. |
A crueldade de maio fez a terra morta germinar
flores
e a chuva ensolarada do outono recobrir o nosso amor, com flores de
açúcar|
E a natural convicção de que somos felizes.
Quando vier o inverno e o vinho tinto nos embebedar,
cercando-nos de todos os lados,
Serei o frio que espera lamber suave as suas terras.
Serei o sol que entregou ao verão o raro diamante, do passado
Serei a estrela que suprimiu das
quatro estações, a Primavera!
Serei o vinho a nutrir os tons secos dos teus versos
Serei o riso que reacendeu a vida com a alegria incontida
Serei a natureza que extraiu
da música, Vivaldi! ...
A genialidade de suas harmonias,
O preencher, com as Quatro
Estações, as nossas vidas.
RUAS DO RIO
Quando o verão nos impõe dançar,
Ele convida os
corpos a se levantarem e a caminhar pelas areias ...
Quando o verão nos impõe dançar,
Ele nos convida a
colorir os parques com a nossa alegria,
A embelezar as praias e a encher as
canteiras de lua e de cerveja.
Em fevereiro, quando a aura das ruas já estiverem
enamoradas do carnaval,
Diga Adeus à melancolia! ...
A aurora dos homens já se
apaixonou pela boa imprudência
E as ruas do Rio retornaram às clássicas e
irretocáveis poesias.
ITABUNA. PEDRA DE LUZ
Dia frio, céu azul, sol brilhante ... O sol ilumina a cidade, radiografando
o rio, expondo as pedras ...
Expondo as
águas que se espalham como fragmentos de diamante.
O rio nos embala com sua canção
distante ... Estou sentado num banco de madeira.
Estou isolado, eu vivo desolado,
em frente as águas.
Faltam-me palavras para compor a cidade que se desenvolve através
de mim.
A cidade que atravessa a outra
margem | e que me leva a pensar no passado |
Quase por milagre ... Sou parte desta
claridade!
Sou parte desse vento que agita o rio
E desalinha os pássaros.
Sou peregrino abrigado sob essa abóbada de intensa luz,
Luz poderosa, dominante ... De repente, o
banco vazio que está olhando o parque |
Sou a lua que olha a cidade e admira as
casas ...
Pedra de Luz, eu vi os poetas escreverem o seu destino!
Eu enterrei os mortos que levaram
adiante o seu traçado |
Sozinha, te vejo se auto reconstruindo ...
A cidade vai
ganhando altura. Nas alturas ela vai soltando a mão do passado ...
Pertenço a esta cidade, a esse emaranhado
de ruas
estreitas, ruas longas, sinuosas ...
Ruas que arrastaram
destinos,
ruas que alcovitaram amores,
ruas que presenciaram beijos e crimes
e silencia
sobre o passado enterrado em terra de sangue e suores.
Em pleno meio-dia ... Os sinos ansiosos
anunciam a Consagração.
Imagino os olhos dourados da Virgem Mãe,
a santa que me
protegeu e me abraçou quando o meu leito era o vento.
Imagino os seus olhos
dourados guiando homens, mulheres e crianças aos seus assentos
homens que chegaram desnorteados,
ávidos
do calor e do verde desta paisagem
Ávidos de sua história, alimentados de instinto e coragem
Ávidos de
pertencerem ao somatório de valores e de brios
as mãos de calos marcados em cada pedra do rio
homens que se dispuseram reconstruir
essa admirável Rosa do Tempo.
QUALQUER CIDADE II
A cidade dorme oprimida pela sua
história. A história se esconde da cidade, com vergonha do seu passado ... Ruas
da Quitanda, Assembleia, Lavradio. Funileiros, milicianos, senhorios, chafarizes,
cortiços e sobrados.
As ruas estão oprimidas pela
violência e as pessoas deprimidas pelas próprias desigualdades
Homens nascem, crescem e
morrem sem suas casas.
Sobrevivem, empilhando amarguras em cascas de ovo
amassado
Nasci no Estado-novo,
Nasci
queimado como os livros,
Nasci proibido como a literatura,
Controlado como os
pensamentos
Viverei sempre marcado,
como um Adão negro
A cada dia um novo pecado que enfrento.
Na arquitetura de hoje as casas
não comportam os inquestionáveis tormentos.
Na arquitetura de ontem, em que
lugar das casas se alojaram os meus antepassados?!
Porta de saída do
paraíso
Algemas encerraram-me neste mar sem horizonte.
Minhas mãos sangram sobre o pano limpo
Você desnorteou minha vida!
Sou o filhote vestindo pele de bicho,
Desgrenhado, lívido, desabrigado em plena tempestade...
Caim fugindo da presença
de Jeová.
Alma de passarinho
Agua nativa não é natural; nem pertence ao lugar em que nasce. Bastão do
imperador jamais viu um imperador de brotoeja. Fruta-do-conde não reconhece um
conde, desde que Cancão de Fogo os dizimou numa peleja; e a bomba que trabalhava
de graça virou relógio com fios explosivos e brincos suicidas de princesa.
Queria plantar jasmins, mas não existem jardins nesta cidade! A boca-da-noite
não usa batom | se muito, o cachimbo natural de um preto-velho. O rio agora é o
tempo secando no tempo. A lua são os olhos da deusa abençoando os amantes; nada
mais, aqui, passa debaixo da ponte ... A ponte nos liga ao nada. As águas-vivas
não têm mais vida! ... Plásticos na água
matam os répteis! E isso não é um conto de Fadas.
Lagarta vermelha pode ser uma carrilhão serpenteando os montes. Os elos foram
partidos, os acordos foram rompidos, os anjos estão caídos e os poetas estão
fodidos! ... Meus santos Carlos, Pessoa, Bandeira ... Não tive Papai Noel! Ajude-me
a encontrar as palavras que caibam nos meus versos! Brigar com palavras é a
dança mais cruel.
Ajudem-me a encontrar aquelas que doutrinem os tolos na política. Presenteiem-me
com versos que alguém possa citá-las de memória! Conceda-me palavras que facilitem
a boa-vontade dos moleques, que se mostrem fluídas nas páginas levíticas, não
Leviatãs juntando elos de coincidências, e que resolvam ficar para a História!
Poeta que não sonha é um poeta triste.
Poetas, levem-me, além da cacimba
onde o sol poente põe os seus ovos!
Levem-me para o oriente além, muito além
daquele lugar que não existe,
O povo vive dentro de uma “Ola!”
Levem-me
aonde o dinheiro não pode ir
e que lá eu encontre bastante amendoim, lantejoulas,
flores, cervejas e bandeirolas.
Levem-me aonde os homens não joguem sonhos e ética na lixeira
Onde as crianças
observam os movimentos práticos
e os condutos sugeridos pela nova escola!
Levem
me onde tenha leitores! ... Isso deve ser longe.
Levem-me aonde o dinheiro não
queira ir sozinho,
e quando resolva voltar, volte com pimenta de cheiro,
cravos,
licores e um pergaminho...
Tragam-me bolo enorme de batata, pão de laranja,
mostrem-me
a estrada, os violeiros e os moinhos.
Digam aonde eu possa livrar-me dos versos cansados,
penteadinhos,
dispostos a matar a alma da poesia.
Cansei-me dos versos floridos,
arrumadinhos ...
Esta velha cigana, a poesia, deveria ser mais franca,
impontual,
sempre e mais irônica!
Talvez destinasse seguir caminhos aleatórios
Quiçá, abandonasse
a fase daltônica
Colasse as almas dos homens às dos passarinhos.
Depois,
meus poetas, os senhores podem me trazer de volta.
INDhiRA
Felicidade é algo que decidi, por princípio.
Decidi ser
feliz e me presenteei com a felicidade
Doei-me a mim mesma, como bônus e não vejo
onde existe fardo, quando me assumo.
Não há por que negar que sou meu próprio dono amando o que
faço.
Inconscientemente estou gerindo-me, me preparando, como
preparo a massa de pão ou brigadeiro ...
Trabalhando naturalmente a rotina dentro do
meu tempo, acompanho as transformações que vão se processando sem itinerário ou
roteiro.
Repartindo as réstias de luz,
multiplicando as gêneses, acendendo a luminosidade
dos pessoais canteiros.
Repartindo, eu dou sentido a muitas vidas,
Encho de cores a
minha casa e de vida o meu-dia-a-dia ...
Eu me vejo sentada à mesa de minha
graça!
Se em cada esquina, alguém pensa em desistir...
É que a coragem
se ausentou e a dúvida se tornou companheira inviável.
Trivialidades já não me
contentam!
Sou a aquarela me auto colorindo e a rusticidade fechando com o que
é inefável.
Enquanto os meus os olhos abrirem, vou sorrir!
Resolvi que
devo rir de tudo!
Vou sorrir, e esta minha condição, em qualquer situação, não
é pecado.
Riu das minhas proezas, riu dos meus absurdos ...
Estando feliz, riu
de mim mesma.
Rir é o bem-estar com o qual estou fechada.
Sou uma pessoa feliz pelo atributo das coisas que guardo.
Todos os dias eu abro o meu cofre para usar o que tenho.
O que
ainda não pude alcançar, colherei nos bons livros.
A saudade muitas vezes traz
as lágrimas boas
Lágrimas das lembranças do que foi essencial ...
Como disse
aquela criança, Saudade é o amor que fica.
Nada vida nada acontece à toa ...
As coisas simples são imponentes e não há o que lhes
equivalha ou seja mais belo
A simplicidade está nas bolhas de ar, quando nos parece
distante,
E são tão simples que podem ser a simbologia dos pequenos dons que
não revelo.
Quando eu fechar o meu extrato, como resultado, guardarei as
boas influências
Amando a mim mesma.
Amando a minha própria companhia,
E concluo que
Eu reunida a Mim,
somos cúmplices indissociáveis
E são cúmplices aqueles que estão
no mundo amando a esmo.
Se quero a felicidade por princípio, o caminho é o trabalho.
Com o trabalho eu traço o meu próprio norte,
Não sou de
iludir-me com a grande-sorte.
O mundo é falho! ...
Mas foi ele quem ensinou-me
que as coisas medidas pelo meu suor
resultam no tesouro em que eu sei que muito valho!
Como folhas ao vento
A canção de nossa vida, o tempo não apaga
É refeição da alma e do espírito
É o alimento que sustenta a nossa casca.
Essência da vida – sabor, sal imaterial, ternura,
Ervas, especiarias, azeite, vinhos e versos ...
Nas ruas, caminhando sob copas de árvores
Sou surpreendido pelo sol que se espalha sobre casarões antigos.
Saúdo flores e folhas que caem à minha volta
A minha rua cruza um país. Cruza o universo reunido no riso dos amigos.
Eu distribuo segredos, como quem
ama ou sorri
A página rasgada, os versos ao vento se depuram
Drummond veio até mim, do jeito mais natural,
Como dois carinhos que se procuram ...
A poesia passa,
Eu passo pelo relojoeiro isolado, num cenário indômito
Ele não me vê, eu o vejo abandonado ao ofício de reordenar o compasso do tempo,
Atualizando reminiscências de um fragmento mecânico.
O padeiro mistura graça e farinha na simbologia dos seus pães
Marceneiros, pedreiros, carpinteiros, religiosos, ricos e pobres
Correm pelos seus honorários
O jornaleiro anuncia o mundo!
Ele ri de tudo, ri o seu riso confraternizado,
O seu alimento paira acima da fome,
Devota-se a cada amizade construída em seu itinerário.
Poeta ou escritor,
Eu busco nos artesões dogmáticos as minhas afeições pessoais.
Poesia é arte que trabalha com a substância da palavra,
Que difunde o indivíduo,
Ilumina um lugar isolado no tempo,
Busca um rosto sombrio na massa ...
São retóricas, alimento, pão e leite, que sustentam
A energia emanada do cérebro e da alma ...
Que o poeta vai semeando por onde passa.
Ofertado do nada
Quando a noite me trouxe o sono, ele já chegou pelas mãos do sol
A cabeça fez a varredura nos pontos cardeais
Deixou-me no meio-leste,
Perto do inferno.
É difícil conjecturar a vida, quando não tiramos os sonhos do caderno.
Wave
O poeta tece a onda de sonhos e louco é quem surfa na crista do tubo de ideias
O poeta tece a casa da ilusão e convida o louco para comandar o tear.
Sem tino, o louco confia no poeta
Sua trilha passeia sobre as linha riscadas em seu desenho
Completamente louco, completamente criança,
Eles escrevem um livro repleto
Das mais claras e visionárias invenções.
Dostoievski desenhou uma cruz nas entrelinhas do seu legado.
Sujeito estranho, ele deixou o coração de lado,
Quando resolveu abrir em sua vida espaço para Deus.
O deus de Dostoievski foi um deus sem amor ceando com Hitler!
Mas foi puro e criança, como cabe somente a um deus...
Na paixão, ele enxugou as chagas nazistas, feitas de pasta de amora?!...
O deus que participou ativamente de sua dívida foi um deus valente
Foi um deus que revelou um discurso com martírios...
Um deus, desses que jamais fariam parte da nossa história.
O deus de Dostoievski foi um deus desnudo, sensual...
Ativamente atípico! ...
Esqueça o deus leal, carente, feito por um gênio.
Os deuses de Dostoievski foram deuses orgulhosos,
Apaixonados!
Geralmente atormentados, impuros, místicos e sem glória!
Caixa de segredos
Aquela paixão, que eu pensei não fosse paixão veio hoje me dizer que eu estava enganado.
É paixão mesmo! ...
A minha dignidade limitou-se a um abraço
Um misto de confusão e de euforia.
A confusão que apareceu no meio do abraço,
que o outro lado, atende por gratidão
A paixão que se desenvolve no silêncio, não pode ter voz.
Mas tem medo! ... Aquele que vê o seu amor rejeitado
Aprende cedo a resguardar a impulsividade
Numa caixinha de segredo.
A Ilha
Mãe, eu estou apaixonado pelo amor!
Nunca mais repita isso! ... Rebate minha mãe.
Amor sofre de banzo!
Amor é aquela coisa bovina, tristonha e mora só numa ilha.
Meu filho, nos corações não há vaga para todos.
O Amor pode até bater em nossa porta
Mas é sofisticado.
Amor precisa de requintes e somos média
A média do povo, por não ter requinte, o amor maltrata.
Por isso ele vive só.
Vive encantado! ... Vive fugindo dos perigos dos relacionamentos ...
vive na sua aparente calma
Não ouse se aproximar dele!
A desilusão o agredirá e pode até ferir sua alma.
Arte e cumplicidade
Inspirações, ideias e angústias, quando batem, batem sempre de madrugada.
Nessa hora você dorme.
O amor, então torna-se um pêndulo oscilando entre dois estranhos.
No meio da noite, naquele instante em que estou passional,
Você é suicida. Eu estou desolado,
Amamentando paixões recém-nascidas.
Cumplicidade não se impulsiona pela energia carnal. É vida!
E como tal, suscita vitalidade no discurso.
O que é necessário para duas pessoas completarem um percurso?
Caminhar com quem tem idêntica vitalidade, não é paixão,
Paixão é dividir-se com o que lhe é diferente.
Caminhar com quem alimenta a essência dos seus sonhos é arte!
As almas gêmeas dispensam tempo, espaço, motivo
Sufragado o elemento sensível,
A própria arte celebrará o pacto sem pacto!
Se entenderam que é amor
a natural fagulha assumirá a culpa, com o auxílio
De todos os pecados e artefatos.
Avisos banais
Salve a água do Planeta. Devore suas próprias ideias. Selecione primas influências. Beba suas escolhas pessoais... Na perseverança de grandes vantagens, arquive sugestões de ombreiras
Feche passagens e portas. Abra algumas janelas para sua companheira.
Não conte os teus segredos ao corvo ... Never more!
Arrombe portas, vá viver em seu cantinho
Não deixe as vicissitudes cuidar de suas botas
Deus errou demais com tantas linhas tortas
Evite contar segredos que o próprio Deus não soube
guardar sozinho.
Não se fazem mais deuses como antigamente!
As gentilezas caem aos poucos e, por pouco, as sutilezas não estão mortas.
A vida não caminha mais para a frente, desde que as frentes políticas viraram-me as costas
A minha generosa aspereza sofre com a rutilância de suas insinuações
A inutilidade começa hoje o seu plano de aborto
Vivo ligado. Porém o mundo está eletricamente absorto ...
O gado aprendeu a caminhar sozinho
Nietzsche foi morrer sem carinho
debaixo das barbas de Deus
o mesmo o Santo Velho que ele teria visto dormindo no horto.
O Poeta mente
Minto para confirmar que minto. Entre mentiras e verdades o lacre é uma casca de
ferida. Quando os meus olhos trabalham, nem no tempo vazio eu
descanso... Minto porque sou poeta com autoridade de recriar a
vida. Se eu fizer conta da verdade, terei de recriar o mundo, conjugando com a imundície.
Por isso, minto! ... Se existe alguma beleza em meus versos ela estará sorrindo na superfície.
A minha poesia não merece o seu tempo, se não estiveres encantado com o que minto.
Minto nas frases, minto nas metáforas e imagens... Minto!
Minto, porque o lirismo é puro e não pretende ir ao fundo do que eu realmente sinto
Minto porque a sinceridade não é evidente.
A verdade fica nos entressentidos, nos intramuros,
Carrega uma bagagem muito grande, porque a dúvida estúpida exige toda a verdade.
A mentira é sempre fluída... Não tem países, mas tem futuro!
A mentira lírica é diferente da mentira retórica que passa de língua em língua,
e vive sem fronteira. Transcende leve, profunda, bela, filosófica,
estradeira...
Se falasse a verdade passaria a dar explicações ao
mundo.
A verdade não é dona da verdade, mas exige esta infâmia, do simples ao mais profundo.
Flores afetivas
Um dia eles apagaram as luzes de todas as esperanças.
Queimaram livros, fecharam bibliotecas, calaram poetas e escritores.
Quebraram as lâmpadas de nossas mentes,
Rasgaram os filtros dos nossos corações.
O poeta maior lamentou: “E agora, José?!... A festa acabou!
O medo nos dividiu, o bem do bem se afastou e o povo isolou-se em frente às tevês.
A ilusão gritava a cada intervalo de novela: “E nós, aonde vamos?”
Dádivas vestiram-se de dúvidas, esperanças travestiram-se de incertezas,
Febres acalmaram temperaturas e a ternura calou fundo em minha beleza.
Restou-nos o quadro nu da utopia,
Despiram os pássaros cativos...
O pão dormido mofou sobre morangos, flores ressentidas secaram,
choraram distante dos nossos ombros,
Sem cores e sem bandeiras ... Sem esperança!
E por encanto, sem nenhuma insinuação de dança.
A cultura sofreu uma ruptura. morreu sobre o impacto
da perda do perfume das flores afetivas.
Wake-up!
Depois de um sono profundo, a juventude retorna às ruas.
Ninguém poderá mais queimar as suas inquietações,
Serão nuvens anunciando chuva ... ?!
E que tornem esse torrão seco em verdes salões
Sem cordialidades, mas sem ferros,
Sem as abelhas astutas a sorverem os favos da realidade notória.
Sejamos formigas a abrir caminhos
Para que esta nova geração possa escrever a sua própria história.
Mestres
O meu espanhol está enferrujado. O meu inglês cansou de me fazer carinho
Assim caminha a humanidade... Os grandes mestres são conduzidos até uma faixa de tempo,
Depois são deixados na estrada, como uma página que se soltou de um livro antigo.
Como os poetas,
Os mestres não sonham a sós,
Na busca dos seus sonhos, eles estão sempre nus!
Vestidos somente dos seus sonhos
Amam o que ensinam, de verdade... E tudo aquilo que amam,
Eles se acostumaram a amar sozinhos.
Mora na filosofia?
Fé resulta do acolhimento à palavra bíblica. Caridade é colhida na fé.
É aquela coisa cíclica: palavra, fé, amor, caridade...
As sementes da caridade são germinadas no amor,
E no pé deste roseiral pousou a esperança do amor fraterno.
Eu já posso ouvir o canto da felicidade...
Mas amor que faz rima com dor está sangrando
Nas portas do inferno!
Discurso em desuso
O jovem de hoje é alienado?!...
Ouço dizer que ele não reconhece em si
mesmo capacidade,
nem sabe explorar a beleza do ser humano.
Dizem que ele se protege, quando pretende se distanciar dos mais velhos.
É
como a Ditadura que se protegia de quem ela mesma torturava...
O jovem de hoje crucificaria a Deus, por não conhecer sua importância.
São
feios, quando expõem sua expressão de vazio
Não são generosos, nem leais...
São lindos quando se agrupam em torno de ideais que não são doentios.
Solidão
Hoje de manhã, quarenta anos...
Eu e o meu espelho.
Ah! Existe espelho?! Eu que o
havia esquecido!
Hoje de manhã, quarenta anos,
mais maduro e comedido
Hoje de manhã, quarenta anos...
Quantos crimes cometidos?!
Quando de manhã se retirou e eu
nem vi o vulto que ficou comigo. Não o conheci.
É sempre assim...
Os corpos se ardem à noite em fogueira,
Vem a madrugada qual geleira e
gela o meu coração
Hoje de manhã, quarenta anos,
O espelho me pergunta se acredito em solidão?!...
Quanto Valemos?
Fraquejaram e rasgaram a carta
branca. As tais conquistas que eram nossas, além do carnaval.
Conspiraram e
nos deixaram a corda-bamba. Roeram a corda do lago fraco, do lado pobre...
E o
Lago Sul?!
O que querem mais de nós? ... Se evadirem não estamos sós.
Te confesso não assimilei o seu
recado: não tenho trabalho, não estou seguro, não tenho vida
Como pagarei meus
compromissos tão diários?...
Todo dia tem feijão, todo dia tem sabão, todo dia
tem tortura e solidão.
Ah, se o teu farol iluminasse a tarja
escura que nos cegou!
Ah, se se um amigo seu comprasse a dentadura que nos restou!
Tô
ralano, batalhano... É a nossa língua incorporada ao nosso caos.
Corro atrás, vendo o peixe, suando a camisa
são ideias de ganhar a vida.
A
sobrevida!
O pão dos indian-boys?!...
Isto não é fotografia. Isto é fato!
Isso dói e como dói!
Quantos somos neste cacho?
Quanto temos em nossas mãos?
Quanto valemos mais que os
pássaros?
Que os ricos trapos de Salomão?!
BOM DIA!
Bom dia, menina bonita!
Do ponto de vista sonoro, a minha saudação seria o nada oco,
Do ponto de vista emocional, uma chama queimando da mão ao pescoço
Quando parti, tornei-me um laivo indefinido
Aquele passo mais longe para o desespero,
Aquele passo de volta, a anunciação
Aquele passo na rua sem uma flor nos meus canteiros
Aquele passo mais ao oriente, em atitude de indignação
O amor e o ódio são partes integrantes de uma mesma célula
São estados opostos da amêndoa coabitando a casca
Dois hemisférios sustentando a galáxia
A face ensolarada, o amor, a vida,
A face sombreada, o ódio, a morte
Bom dia, menina linda,
Ainda não sei que parte da amêndoa eu morderei.
EU TE AMO
Eu te amo. Eu te amo. Eu te amo. Eu te amo, eu te amo, eu te amo ... Euteamoeuteamoeuteamo ...
Esta ode não pode existir subliminarmente. O paroxismo precisa ser ressaltado
e ressaltado no presente.
O presente é o ópio dos dias que caminham poderosos sobre mais alguns dias à frente
"Bom dia!’
“Faça-me o favor”
“Desculpa-me”
"Tô de saco cheio são portas de saídas
Além das entrelinhas está subentendido que nos obcecamos por um outro amor.
Indômito, com contas sem pagar,
E o oficial em nossa porta.
Dizemos "Eu te amo" quando queria abrir sua jugular
Mas, diga, Eu te amo! ainda que a veja caidinha, morta
Eu te amo
Estou saindo,
Não sei a que horas volto ... Bem, até onde sei, o meu relógio quebrou.
Se o homem não descobre resquícios de virtude dentro dele.
Ele se tornará
escravo.
Poesia de vento
Ela veio ontem à minha favela
Mas não molhou os pés
Deus sol lavou o rio
Saia vermelha,
Sombrinha amarela
Aros dourados
Estação de aquarela
Ela acendeu a minha vida
E até a janela do sol abriu
Ontem ela entrou na minha vida
Ladrilhei em ouro a minha rua
Plantei uma cidade ...
Ela não atravessou o rio
Quando entrou em meus sonhos
Pisou os jardins do barraco
Fez lume dos pássaros dormindo nos fios
Ontem o amor invadiu o meu espaço
Poeta, filósofo, malandro ... pintei de azul os cadarços
Pus mel e limão nas águas do rio
que lindo, ela iluminando as ruas da favela
eu cavalheiro, ela a mais bela
Ela princesa, eu pobre gentio
Mas ela não posou no meu barraco
Cavalos de sol ...
Águas do tempo
Poesia de vento,
Cavaleiros andante, companheiro hesitante. Moinhos...
Ela não atravessou o rio.